Festa de timbres do barroco

Durante muito tempo, mas muito tempo tempo mesmo, desde a antiguidade e por vários séculos, a música européia foi fundamentalmente vocal.

A maioria dos instrumentos eram rústicos, tinham poucos recursos, e a técnica instrumental era muito limitada.

Isso tudo porém foi mudando no final da idade média; e no século XVI, em pleno renascimento, surgiu uma verdadeira festa de timbres, promovida por vários instrumentos diferentes.

No período barroco essa festa se sofisticou!

No início do século XVII, o compositor alemão Michael Pretorius compilou uma enorme coleção de danças da idade média e renascença, que nos dá uma ótima idéia da música instrumental daquele tempo!

Você pode ouvir várias aqui:

Esta festa começou na renascença, e continuou daí pra frente, mas com uma diferença muito importante: a especialização e definição instrumental.

Até uma certa época, os compositores não definiam que instrumentos deveriam ser usados. Ele escrevia a música, e a escolha dos instrumentos ficava a cargo dos próprios executantes.

Assim, a mesma peça podia ser tocada por um conjunto de flautas, ou por um conjunto de violas da gamba .

Mas essa indefinição não iria durar muito tempo.

No período barroco, os compositores começam a compor especialmente para determinado instrumento ou conjunto de instrumentos.

Vejamos alguns exemplos, começando pelos violoncellos.

Giuseppe Maria Jacchini, que viveu entre 1670 e 1727, e foi portanto, contemporâneo de Antônio Vivaldi, foi um pioneiro do violoncello.

Foi um dos primeiros violoncelistas-compositores da Europa.

Nada mais natural, portanto, que a maioria das peças que escreveu sejam para esse intrumento. Ele foi um dos responsáveis por fazer do violoncello um instrumentos solista.

Confira:

Vamos às flautas. E quando falamos delas e de música barroca, é muito natural nos voltarmos para o repertório francês, com o compositor Joseph Bodin de Boismortier, que viveu entre 1689 e 1755 e foi portanto contemporâneo de J. S. Bach e Vivaldi.

Boismortier foi um muito popular entre os apreciadores de música franceses de seu tempo. Sua música era tão bem aceita, que ele foi um dos primeiros a ter uma certa independência financeira, sem precisar de patrocinadores, ou seja: ganhou um bom dinheiro vendendo suas partituras e apresentando-se em concertos públicos – quando esses eram ainda uma grande novidade.

Muitos compositores franceses tinham uma especial predileção pela flauta, e Boismortier foi um deles. E numa época em que muitos escreviam para a flauta doce, ele dedicou-se especialmente à flauta transversal.

Escreveu uma série de concertos para conjunto de cinco flautas transversais que foram uma total novidade para a época.

Ouça aqui:

Agora uma combinação que pode surpreender alguns ouvintes: dois bandolins, acompanhados por orquestra de cordas. Eu falo em surpreender porque muitas pessoas associam o bandolim à música popular brasileira, em especial o chorinho; muita gente não imagina que o bandolim tenha sido usado na música clássica européia.

Mas foi, sim, e muito. Temos belíssimos exemplos de Vivaldi!

Vários musicólogos acreditam que estes concertos foram compostos para a orquestra de meninas que viviam no “ospedale della Pietà”, de Veneza. Eram órfãs, filhas ilegítimas ou de famílias muito pobres. Segundo comentários da época, os conjuntos musicais formadas por essas meninas tinham um nível artístico elevadíssimo.

Vivaldi tinha especial carinho por esse trabalho. Compôs para o Ospedalle durante quase 40 anos, praticamente até o final de sua vida, e muitas vezes trabalhou sem qualquer remuneração.

Há um concerto de Vivaldi com uma formação surpreendente!

O que me dizem da seguinte combinação: duas flautas doces, dois “chalumeaus”, dois violinos “in tromba marina”, dois bandolins, duas teorbas e um violoncelo?

Vale a pena nos atermos um pouco a ela.

Começamos com duas flautas doces – instrumentos bastante conhecidos. Mas em seguida temos dois chalumeaus, e eu estou certo que pouca gente já ouviu falar deles. O chalumeau foi um instrumento que esteve em voga entre 1700 e 1750, sendo então substituído pelo clarinete. É portanto considerado um ancestral deste instrumento.

Temos também dois violinos “in tromba marina”. Sabemos que a “Tromba Marina era um instrumento de cordas muito peculiar, bastante conhecido na idade média. Tinha uma coluna de madeira de cerca de 2 metros, com uma única corda.

Pois bem, o que seriam os violinos “in tromba marina”?

O encarte de um CD do seríssimo conjunto “The english Concert”, diz que se trata de um enigma!

Temos ainda dois bandolins, um violoncello e duas teorbas. Estas são pouco conhecidas. A Teorba é um instrumento criado na Itália no século XVI, e se assemelha ao alaúde, sendo maior e portanto mais grave.

Esse concerto é simplesmente sensacional! Tem que ser ouvido!

Está aqui:

Em se tratando de combinação de muitos instrumentos, não podemos deixar de nos lembrar dos concertos de Brandenburgo…

Nos 6 concertos de Brandenburgo, J. S. Bach também explorou as combinações instrumentais com muita riqueza.

Um exemplo: o Concerto de Brandenburgo no. 2.

Nele há quatro solistas com potências sonoras muito diferentes: trompete, que é muito potente, oboé, que tem potência mediana, violino que é ainda menos potente, e flauta doce, que é o menos potente de todos.

Equilibrar esses quatro instrumentos, de modo que todos possam ser perfeitamente ouvidos é muito difícil, mas Bach o fez com muita maestria.

Confira:

Espero que você tenha gostado desta “Festa de Timbres do Barroco”!

DICA DE LEITURA:

Concerto Barroco, de Alejo Carpentier.

Atenção:este não é um livro de históra da música. Não oferece informações 100% verídicas sobre a música barroca. Trata-se de um magistral livro de ficção, escrito por um gênio da literatura latino-americana, e ao mesmo tempo amante da música: o cubano Alejo Carpentier (1904-1980)

Eis a sipnose:

Em inícios do século XVIII, um milionário da prata mexicana, neto de umconquistador maltrapilho, aristocrata há uma geração apenas, deixa a terra natal para uma temporada de luxos e prazeres em Veneza. Chegando à cidade em pleno Carnaval, o Amo e seu criado Filomeno serão protagonistas de um concerto sem igual, que reunirá os maiores prodígios da Europa barroca, mas também a música do Velho e do Novo Mundo. O livro de Carpentier nos leva de uma Cidade do México que imita em prata lavrada todas as manias metropolitanas de uma Veneza em que, depois de muita peripécia erótica e musical, o Amo transformado em libretista do padre Antonio Vivaldi tentará levar à cena uma versão fiel e operística da conquista do México. A tarefa, está claro, é impossível, mas o fracasso não resulta em impasse. Numa virada final – anacrônica e fabulosa, barroca e moderna ao mesmo tempo -, caberá a Filomeno tomar a batuta e transplantar sua própria versão do barroco de volta à América – e de volta ao século XX.

Alejo Carpentier chegou ao ápice de sua arte narrativa e musical nesta breve obra-prima de 1974, que o autor chamou de “suma teológica” de sua carreira e que o leitor brasileiro agora pode ler na primorosa tradução de Josely Vianna Baptista.

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Um comentário em “Festa de timbres do barroco”

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