Elfrida Andrée

A compositora Elfrifa Andrée

A compositora Elfrida Andrée viveu entre 1841 e 1919. Foi a primeira sueca a ter um cargo oficial como organista – o que foi uma grande novidade em seu tempo. Para nós, nos dias de hoje, isso pode parecer uma bobagem. Não é, caro leitor. Havia na Suécia daquele tempo algumas leis que simplesmente impediam as mulheres de abraçar determinadas profissões – como por exemplo, operador de telégrafo.

Família

A Suécia, terra nata da compositora Elfrida Andrée.

A vida da compositora Elfrida Andrée foi, portanto, uma eterna luta para abrir caminho numa sociedade extremamente conservadora.

Para isso, seu pai foi determinante! Ativo militante liberal, ele passou a vida lutando por mudanças nas leis e na sociedade suecas que abrissem espaço para as mulheres. Não se tratava apenas de palavrório: ele realmente realizou ações políticas nesse sentido, sempre pensando em suas duas filhas.

Ela e sua irmã, Fredericka, que viria a tornar-se uma cantora de ópera, começaram a estudar música com o próprio pai. Estudaram piano, canto harmonia e órgão.

Abaixo você pode ouvir um movimento da bela sonata para piano em lá maior composta por Elfrida.

Piano Sonata in A Major, Op. 3: I. Allegro moderato

Dificuldades

Quando chegou a hora de trabalhar, começaram as dificuldades. A mesma lei que proibia as mulheres de operarem telégrafo também as proibia de trabalhar como regentes ou preparadoras de coro, ou atividade semelhante.

Contudo, algum tempo depois, graças à ferrenha luta política do seu pai, Elfrida pôde trabalhar nessas atividades por bastante tempo. E talvez não seja demais dizer que Elfrida também trabalhou por um tempo justamente como… operadora de telégrafo…

A combinação de talento, sólida formação musical e ativismo político liberal foi o que tornou possível Elfrida fazer da música uma carreira profissional.

Instrumento favorito

E em seu caso, a composição estava intimamente ligada à atividade como organista. Ela foi organista em várias igrejas, destacando-se as catedrais de Estocolmo e de Gotemburzgo.

Como não poderia deixar de ser, escreveu várias peças para seu instrumento, com grande destaque para duas sólidas sinfonias para órgão, uma delas incluindo instrumentos de sopro.

Elfrida Andrée (1841-1929) – Organ Symphony No.1 in B Minor. Organist: Ralph Gustafsson

Obra a ser descoberta

Elfrida Andrée chegou a ser reconhecida e até premiada em vida; mas a verdade é que sua obra permanece desconhecida. Apenas uma fração dela foi impressa; muitas foram executadas apenas em concertos privados; a maioria das execuções se deu só dentro da Suécia; finalmente, há muito poucas gravações disponíveis.

É uma obra que está para ser descoberta: além do repertório para órgão, destacam-se uma ópera, duas sinfonias, uma abertura sinfônica, muitas peças para piano, para coro e para música de câmara.

String Quartet in D Minor: III. Allegretto grazioso pastorale

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Saudações Musicais!

Clara Wieck Schumann

Se você digitar no Google a expressão “List of female composers” – Lista de mulheres compositoras, em português, verá surgir diante de seus olhos uma lista com centenas – isso mesmo, centenas de nomes.

A mais antiga, Safo, nascida no ano de 612 ac, até Barbara Ardanuy, nascida em 1988. É mesmo uma relação impressionante, que reforça a questão: por que não se ouve falar delas?

Bem, para mim a resposta é muito simples: vivemos um mundo machista e patriarcal, em que o lugar das mulheres sempre foi no lar, longe da maioria das disputas profissionais. Apenas pouco a pouco elas foram conquistando seu devido espaço.

Nem seria demais lembrar que até cento e poucos anos atrás, nos países mais modernos, a mulher não tinha direito a voto.

Portanto, essas mulheres compositoras que figuram na lista se dedicaram à música, mas sem entrar nas disputas de “mercado”, para falar na linguagem atual. Isso só começou a acontecer mesmo no início do século XX.

Assim, para termos uma ideia bem real de como essas mulheres compositoras viveram e trabalharam, eu pensei em pesquisar a vida de uma delas; a mais conhecida de todas, ou talvez a menos desconhecida: Clara Wieck Schumann, esposa do compositor Robert Schumann.

Início

Já há o que contar antes dela nascer: seu pai já havia decidido que seu filho seria levado a estudar música a fundo, torná-lo um artista de excelência, e conduzi-lo à vida musical profissional. Será que Wieck cogitou que seu filho pudesse nascer uma… filha? Não sabemos, mas o que sabemos é que ele se manteve determinado em seguir seus planos.

Aos cinco começou a dar-lhe aulas de piano. Depois de muitas apresentações privadas, a pequena Clara fez sua primeira aparição pública na sala Gewandhaus de Leipzig.

Era o dia 20 de outubro de 1828. A pequena Clara tinha apenas 9 anos de idade.

Logo ela começaria a estudar violino, canto, instrumentação, leitura de partitura orquestral, contraponto e composição.

Com 15 anos de idade já era aclamada por toda a Europa como um fenômeno; uma criança prodígio! Entre seus fãs estavam ninguém menos que Mendelssohn, Chopin e Paganini… Já fazia 5 anos que compusera suas primeiras obras.

Abaixo, a 1ª peça de 4 Peças características para piano, opus 5, escritas quando ela tinha ainda quinze anos de idade.

Cada uma tem um título: a 1ª é Improviso: O Sabah; a 2ª, Capricho em Bolero; a 3ª é um Romance, e a 4ª uma “cena Fantástica: o Balé dos Fantasmas”.

4 Pièces caractéristiques, Op. 5: No. 1, Impromptu (Le Sabbat)

Embora não se trate de uma obra prima, a obra é deliciosa de se ouvir, divertida, e mostra que a menina tinha mesmo muita imaginação.

Sucesso

Nos anos seguintes, só sucesso! Concertos por toda a Europa, mais elogios de celebridades, como Franz Liszt, que a considerava uma artista completa, apesar da pouca idade.

Aos 17 anos recebeu uma condecoração da Corte Imperial Austríaca, raramente outorgada a um estrangeiro. Tudo ia, portanto, muito bem, até que ela se apaixonou pelo compositor Robert Schumann.

Casamento

Schumann agiu corretamente: pediu a mão da jovem a seu pai; mas isso resultou numa imensa briga, num conflito que durou 3 anos e obrigou os jovens apaixonados a entrar com uma ação na justiça, contra o pai de Clara, para poderem se casar.

Wieck fez de tudo, chegando a agir irracionalmente, mas de nada adiantou. Clara e Robert Schumann se casaram em 1840. Clara tinha 21 anos, Robert 30.

Aí aconteceu o inevitável: a carreira de Clara sofre um enorme baque. Tinha uma casa para cuidar; a casa só tinha um piano, e a prioridade era do marido, que ficava horas e horas trabalhando sobre ele. Logo vieram filhos: 8 ao todo, 1 após o outro.

Carreira

Mesmo assim Clara, heroicamente, deu um jeito de continuar tocando. Fez apresentações em Copenhagen e na Rússia. Lecionava no Conservatório de Leipzig, e também dava aulas particulares em casa.

Compor ficou em último lugar. Ela não chegou a abandonar a atividade, mas a produção foi pequena. Por outro lado, o nível subiu. A maturidade mais o convívio com as ideias sérias do marido sobre a música e sua importância, fez com que o estilo de Clara se depurasse.

Abaixo, você pode conferir o Trio para violino, violoncelo e piano opus 17, composto quando Clara estava com 28 anos de idade, entre o 4º e 5º filho. São 4 movimentos: Allegro Moderato, Sherzo: Tempo di Minuetto, Andante e Allegretto.

Clara Schumann: Piano Trio Op. 17 (1846)

Sensibilidade

Apesar do pouco tempo que sobrava, Clara ia compondo, quando era possível. Como excelente pianista que era, a maioria das obras que criou são para esse instrumento.

Para música de câmara há apenas uma outra obra, para violino e piano. Para orquestra, apenas duas obras.

Mas há um gênero que Clara cultivou com a mesma atenção que deu para sua obra pianística: a canção. O número de canções que deixou se aproxima ao número de peças para piano que produziu. Era um gênero em que sua sensibilidade pessoal estava muito à vontade.

Ich Stand In Dunklen Träumen, Op.13, No.1

Uma pequena amostra da imensa sensibilidade de Clara Wieck Schumann para criar canções.

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Saudações Musicais!

Albinoni

O compositor alemão Johann Pachelbel, predecessor de J.S. Bach, autor de uma obra imensa e de altíssima qualidade, é lembrado hoje apenas por uma obra, conhecida por “Canon de Pachelbel” uma peça bem escrita agradável de se ouvir, mas que seguramente não está entre o que ele fez de melhor.

Pachelbel merecia ter sua obra mais tocada, mais conhecida. Este é o exemplo mais conhecido de “compositor de uam obra so´”. Mas há muitos ouros! Vamos então falar aqui de um outro compositor com quem acontece algo muito semelhante: o italiano Tomaso Albinoni.

Adagio para Cordas

Tomaso Giovanni Albinoni nasceu em Veneza, no ano de 1671, ou seja, foi como Pachelbel um predecessor de J.S. Bach. E como Pachelbel é lembrado hoje em dia por uma única obra: o Adagio para cordas, órgão e violino solista.

Esse adagio foi um dos maiores sucessos da indústria fonográfica na 2ª metade do século XX. Muitas orquestras o gravaram e ganharam muito dinheiro com isso, até mesmo a mais sagrada de todas: a Filarmônica de Berlim, quando era dirigida pelo maestro Herbert von Karajan.

Albinoni – Adagio in G minor (Karajan)

Pelo menos isso é o que está escrito na capa do disco; na verdade hoje sabemos que essa peça não é de Albinoni.

Remo Giazotto

Para entendermos a história desse Adagio precisamos voltar no tempo, até março de 1945, quando houve um grande bombardeio sobre a cidade de Dresden, na Alemanha.

Na ocasião, a biblioteca da cidade foi destruída. Muitos documentos importantes desapareceram, entre eles muitos manuscritos de obras de Albinoni que nunca haviam sido editadas.

Pois bem, alguns anos depois, um musicólogo italiano chamado Remo Gaziotto disse ter obtido um fragmento de uma partitura de Albinoni que havia sobrevivido ao bombardeio, e que a partir desse fragmento reconstruíra um movimento de uma sonata do compositor.

A obra foi lançada em 1958, e fez muito sucesso. Porém, à medida que outras peças de Albinoni foram sendo descobertas, percebeu-se que o tal adagio não parecia em nada com elas.

Pressionado, Gaziotto acabou admitindo que se tratava mesmo de uma composição sua.

No link abaixo, você pode ouvir uma obra genuína de Albinoni.

T. ALBINONI: Sinfonia for Strings and B.C. in G minor Si 7, La Serenissima

Como você certamente notou, um estilo nada parecido com o Adagio de Remo Giazotto. Nada daquela dramaticidade gigantesca do Adagio, do sentimentalismo exacerbado, desesperado, do final do século XIX, mesclado com os padrões harmônicos dos compositores barrocos, cuja obra estava sendo descoberta aos poucos, e fazendo muito sucesso.

Casos Similares

Fritz Kreisler

O italiano Remos Giazotto não foi único a criar Frankensteins musicais como esse. Existem muitas obras do gênero, como dois concertos para viola do francês Henri Casadesus, um atribuído a Handel, outro a J.S. Bach. Seu irmão, Marius Casadesus, compôs um Concerto para Violino e disse que era de Mozart.

E o violinista austríaco Fritz Kreisler compôs mais de 15 peças que atribuiu divertidamente a vários compositores, como Couperin, Boccherini, Tartini e muitos outros.

Durante algum tempo acreditou-se que se tratavam de obras originais, mas pouco a pouco, a verdade foi vindo à tona. E o interessante é que muitas dessas peças tem qualidades musicais e são tocadas com frequência.

Vida e Obra

A vida de Albinoni foi uma exceção entre os compositores de seu tempo. Ao contrário de 99% deles, que vinham de famílias pobres, e precisavam de um bom emprego para sobreviver, Albinoni era filho de uma família rica.

Graças a essa condição, decidiu dedicar-se inteiramente à música, do modo como desejava, ou seja, sem ter que atender os gostos de seus patrões.

Inicialmente estudou violino e canto, e a maior parte de sua obra é de música vocal.

Escreveu mais de 80 óperas; sabemos o nome de todas elas, e quando estrearam. Porém, a maioria das partituras se perdeu, muito provavelmente na destruição da biblioteca de Dresden. Lamentavelmente, dessas 80 óperas, restaram as partituras completas de meia dúzia.

“Vespetta e Pimpinone”

Vejamos um exemplo, “Vespetta e Pimpinone”. Trata-se de um “Intermezzo”, palavra usada naquele tempo para uma ópera pequenina, leve e de caráter cômico. A trama de Vespetta e Pimpinone era muito comum e serviu de base para outros compositores como Pergolesi e Telemann.

Uma jovem bonita e esperta vai trabalhar como empregada na casa de um senhor idoso, rico e… bobo. Acaba, graças à sua astúcia, casando-se com ele e consequentemente, mudando de nível social.

Vespetta e Pimpinone: Intermezzo Primo – Aria

Repertório Instrumental

A música instrumental de Albinoni teve mais sorte que sua obra operística. Muitas partituras de seus concertos foram preservadas até hoje, e muitos deles foram gravados.

Ele deixou nada menos que 99 sonatas, 59 concertos e 9 sinfonias, e boa parte dessas partituras foi, felizmente, preservada.

Esse repertório instrumental foi bem divulgado, atraindo a atenção de outros músicos de fora da Itália, até mesmo de J.S. Bach, que escreveu fugas baseadas em temas de Albinoni.

Albinoni foi violinista e é natural que a maioria de seus concertos seja para violino solista. Contudo, ele deixou uma imensa contribuição para o repertório do oboé.

Aparentemente foi o 1º compositor italiano a utilizar o oboé como instrumento solista, e também um dos primeiros a utilizar os oboés como parte integrante da orquestra. Dos seus concertos para o oboé, o mais tocado é o Opus 9, nº 2.

Albinoni: Concerto a 5 in D Minor, Op. 9, No. 2 for Oboe, Strings and Continuo – 1. Allegro e non presto

Pena que uma grande parte das obras de Albinoni tenha se perdido durante a 2ª Guerra. Mas os musicólogos estão por aí, trabalhando, e quem sabe outras cópias dessas obras não serão descobertas?

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Leonard Bernstein

Filho de imigrantes ucranianos, Leonard Bernstein nasceu numa pequena cidade a aproximadamente 50 Km de Boston, no norte dos Estados Unidos. Estudou música em escolas de primeiríssimo nível – a Universidade de Harvard, e o Curtis Institute, da Filadélfia.

Depois de terminar curso no Curtis Institute, Bernstein seguiu para Nova Iorque, onde começou a trabalhar e tomar contato com música popular. Sua carreira progrediu muito rapidamente, até ser indicado regente assistente da Orquestra Filarmônica de Nova Iorque.

Um dia, o regente convidado Bruno Walter adoeceu subitamente, e Bernstein teve que reger em seu lugar, de última hora e sem ensaio. Foi um imenso sucesso!

O concerto havia sido transmitido para todo o país, e no dia seguinte, o New York Times reportou a história na primeira página e no editorial. Bernstein tornou-se, do dia para noite, uma celebridade. Era novembro de 1943, e ele tinha apenas 25 anos de idade.

Jeremias

Além disso, nessa mesma época Bernstein começava a aparecer como compositor, de sólida formação. Antes desse primeiro sucesso como regente, ele já havia escrito sua primeira sinfonia, intitulada “Jeremias”. Cada um de seus movimentos tem também um título. O 1º é Profecia; o 2º Profanação e o 3º Lamento.

Bernstein: Symphony No. 1 “Jeremiah” – II. Profanation. Vivace con brio (Live)

Fancy Free

Vamos agora para a música do Balé “Fancy Free“, de 1944. A coreografia foi de Jerome Robbins, que se tornou muito conhecido por seus trabalhos na Broadway.

No vídeo abaixo podemos ouvir alguns trechos da música que Bernstein escreveu para esse espetáculo; aqui, a influência do jazz é claramente perceptível.

BERNSTEIN: Fancy Free: Three Dance Variations / CYSO’s Symphony Orchestra · Tinkham

Uma obra em que a fusão do clássico europeu com a música popular norte-americana é evidente – incluindo até uma pitada de música popular cubana no último movimento.

Big Band

Em seguida uma obra que eu considero muito especial: Preludio, Fuga e Riffs, para clarineta solo e Big Band.

Aqui a mescla entre música europeia e norte-americana é ampla. Temos uma das mais antigas e consagradas formas clássicas, o prelúdio e a fuga. A forma é clássica, mas o meio de expressão escolhido é tipicamente jazzístico: a Big Band.

A Big Band é uma das mais notáveis invenções musicais norte americanas, uma pequena orquestra de altíssima potência sonora e versatilidade, formada por trompetes, trombones, saxofones e uma sessão rítmica.

Tudo isso além da clarineta solista. O tecido musical foi cuidadosamente trançado usando ritmos e harmonia do jazz e da música europeia. E finalmente, não posso deixar de dizer que a forma original – Prelúdio e Fuga, tão europeia – foi contaminada por uma terceira parte tipicamente jazzística, chamada Riffs. A palavra riff significa um trecho musical simples que é repetido muitas vezes.

Leonard Bernstein – Prelude Fugue and Riffs (1949)

A peça tem três movimentos: Prelúdio para os metais, Fuga para os saxes e Riffs para todo mundo.

West Side Story

Para terminar, vamos à obra mais conhecida de Bernstein: West Side Story, um musical da Brodway produzido no ano de 1957.

O espetáculo partiu de uma transposição de Romeu e Julieta, de Shakespeare, para os subúrbios de Nova Iorque. Dois jovens, pertencentes a etnias e gangues rivais, se apaixonam, Maria, de ascendência Porto-Riquenha, e Tony, de ascendência Polonesa.

A forte temática social, sofisticadas coreografias e igualmente sofisticada música fizeram com que a peça se tornasse um divisor de águas no teatro musical norte-americano.

Foram realizadas nada menos que 732 apresentações, e em seguida o espetáculo começou a viajar. Quatro anos mais tarde ele virou filme, recebendo nada menos que 10 Oscars.

Na mesma época Bernstein preparou uma suíte sinfônica da música original, intitulando-a “Danças Sinfônicas de West Side Story”. É uma obra admirável, uma das mais executadas do compositor.

Ela tem nove movimentos, que são tocados sem interrupção:

1) Prólogo

2) A canção Somewhere

3) Scherzo

4) Mambo

5) Cha-cha

6) Cena do Encontro

7) Fuga

8) Briga de Rua

9) Finale

Symphonic Dances from “West Side Story”

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Bach e Vivaldi

Qual seria a relação entre Bach e Vivaldi? Relação pessoal nós sabemos que não houve; Bach nunca saiu da Alemanha; Vivaldi, até onde se sabe, nunca foi até lá.

Além disso, não há nenhuma carta trocada entre os dois mestres. Mesmo assim, sabemos que J. S. Bach conheceu a música de Vivaldi.

Isso é absolutamente certo, porque Bach transcreveu para cravo e para órgão, concertos de Vivaldi escritos originalmente para um ou mais violinos e orquestra.

Essas partituras de Bach ficaram para posteridade, são autênticas, e, portanto, provam que Bach não só conhecia, mas apreciava a música de seu contemporâneo italiano.

Numa rápida pesquisa, eu levantei 10 obras de Bach feitas a partir de Vivaldi.

A mais comentada é o concerto para 4 cravos, catálogo BWV 1065, que é uma transcrição do Concerto para 4 violinos de Vivaldi op. 3 nº 10.

Até mesmo para quem já conhece as duas obras é uma experiência interessante ouvi-las em seguida, e compará-las.

Vivaldi – Concerto in B Minor for 4 Violins, Op. 3 no.10 RV 580: I Allegro

Na versão original, de Vivaldi, temos quatro violinos solistas acompanhados por uma pequena orquestra. Esta orquestra é formada por 1ºs violinos, 2ºs violinos, violas, violoncelos, contrabaixos e cravo.

J.S. Bach: Concerto for 4 Harpsichords, Strings & Continuo in A Minor, BWV 1065 – I. Allegro

Transcrição

Em sua transcrição, Bach manteve a mesma formação orquestral. Os quatro solistas, contudo, são quatro cravos, em lugar de quatro violinos.

Trata-se do primeiro concerto escrito para quatro instrumentos de teclado, acompanhados por orquestra. Bach manteve escrupulosamente a mesma forma estabelecida por Vivaldi.

Fazendo uma analogia, poderíamos dizer que, se o concerto de Vivaldi fosse um texto literário, o concerto de Bach seria exatamente o mesmo texto, com a mesma história, com o mesmo número de parágrafos e frases. Haveria algumas palavras a mais, que deixariam o texto um pouco mais ornamentado, mas nada seria mudado em sua essência.

Diferenças

Falei como Bach ateve-se escrupulosamente à partitura original de Vivaldi, introduzindo algumas alterações puramente ornamentais. Indo além, podemos também refletir um pouco sobre as diferentes sonoridades obtidas.

Violino e cravo têm diferenças marcantes, e eu chamo a atenção para duas delas.

A primeira é a possibilidade do violino tocar notas muito mais longas que o cravo. No cravo, o instrumentista pressiona uma tecla, uma nota é gerada e dura poucos segundos, até esvair-se totalmente.

O violino, por sua vez, é capaz de emitir uma nota muito longa, muito mais longa que a do cravo. Se o violinista utilizar o arco com cuidado, poderá até simular uma nota de duração indefinida.

Por isso, em alguns trechos, para compensar a falta de sustentação sonora do cravo, Bach, no lugar das notas longas originais, escreve muitas notas em seguida, em fragmentos de escalas ou arpejos.

A segunda grande diferença entre cravo e violino é que o cravista pode tocar várias notas ao mesmo tempo, coisa que no violino é bem complicada,

Assim, em alguns trechos onde Vivaldi escreve para o violino apenas uma nota por vez, Bach escreve para o cravo duas ou mais linhas melódicas simultâneas.

Esses são exemplos das tais diferenças ornamentais que eu citei há pouco.

Órgão

Vamos agora, caro leitor, para outra obra de Vivaldi, transcrita por Bach. Trata-se de um concerto para dois violinos, acompanhados por pequena orquestra, também formada por 1ºs violinos, 2ºs violinos, violas, violoncelos, contrabaixos e cravo.

Bach transcreveu este concerto não para cravos solistas, como no caso anterior. Ele escolheu para isso o órgão – apenas um órgão.

Este único órgão toca a parte dos dois violinos solistas e também da orquestra – que Bach simplesmente dispensou.

Concerto for 2 Violins in A Minor, Op. 3 No. 8: I. Allegro
Bach: Organ Concerto in A Minor, BWV 593: I. (Allegro)

Como eu dizia há pouco, Bach conseguiu transcrever para um órgão apenas, as notas tocadas pelos dois violinos solistas e pela orquestra.

O leitor pode perguntar: mas isso é possível?

É, caro leitor. Acontece que o órgão é um instrumento de muitos recursos. A partitura desta peça que acabamos de ouvir é escrita em três pentagramas: um para a mão direita, outro para a mão esquerda outra para os pés do organista.

Além disso, o órgão pode fazer as tais notas longas, sustentadas, que o cravo não pode. Comparamos, portanto, duas obras de Vivaldi para violinos solistas e orquestra, com duas transcrições de Bach bem distintas, uma para cravos solistas acompanhados por orquestra, e outra para órgão solo.

Em ambas, o texto musical original, de Vivaldi, foi cuidadosamente respeitado; as modificações introduzidas por Bach têm caráter puramente decorativo. O que variou e muito foram as sonoridades obtidas em cada caso.

Benedeto Marcello

Bach conhecia a obra de muitos outros compositores italianos além de Vivaldi. Isso era natural, pois a música Italiana era apreciada e divulgada em toda a Europa, exercendo quase que uma hegemonia naquele tempo.

Vivaldi era de Veneza, cidade onde se fazia muita boa música há séculos, e outros compositores notáveis foram seus contemporâneos.

Um deles foi Benedeto Marcello, de quem Bach transcreveu para cravo solo um concerto original para violino solo e orquestra.

Bach BWV 981 Harpsichord Concerto in C minor after Benedetto Marcello Concerto Op 1 no 2

Espero que tenha gostado deste post.

E se quiser saber mais sobre as transcrições de Bach, aqui vai uma dica!

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Compositores Espanhóis

A Espanha sempre fascinou os compositores franceses. Ravel, Debussy, Lalo, Chabrier, Bizet, escreveram obras de grande beleza inspiradas na música daquele país. E o mesmo aconteceu com compositores de outros países, como os russos Glinka e Rimsky-Korsakov. Contudo, os compositores espanhóis continuam bem pouco conhecidos do público amante de música de concerto.

Assim, nossa postagem de hoje será dedicada a alguns deles, e eu tenho certeza de que quem não conhece vai se encantar com esse repertório de forte personalidade.

Eu não sei se vocês já notaram, mas quando se fala em música clássica, vem imediatamente à cabeça de todo mundo uma série de compositores de cultura germânica, alemães ou austríacos: Bach, Händel, Mozart, Haydn, Beethoven, Brahms, Wagner. E    sobra apenas um pouco de espaço para alguns compositores de outros países, como os russos Tchaikovsky ou Rachmaninof, ou os franceses Berlioz ou Ravel.

História

No século XIX, os compositores alemães exerciam um verdadeiro domínio sobre a cultura musical de vários países, e esse foi um dos motivos do surgimento das escolas nacionalistas. É como se a música alemã estivesse no centro, e a música dos outros países estivesse na periferia. Pois bem, neste cenário a música espanhola parece estar na periferia da periferia, o que é absolutamente injusto.

Enquanto alguns países só floresceram musicalmente na segunda metade do século XIX, na onda do movimento nacionalista, a Espanha registrava   um riquíssimo passado musical desde a idade média.

Após a queda do império romano, a península ibérica foi invadida pelos Visigodos. Convertidos ao Cristianismo, os visigodos desenvolveram um extenso repertório    de cantos religiosos. Mais tarde, sob domínio árabe, os cristãos continuaram seus ritos com melodias fortemente influenciadas pela música dos invasores, e desenvolveram   mais uma vez um estilo próprio, distinto do canto gregoriano: o canto moçárabe.

Ao chegar à renascença, duas principais formas musicais se definiram na Espanha: o Romance e o Vilancico. O romance era uma canção em geral de caráter narrativo, com texto literário, comumente cantado nas cortes, por coros ou por um cantor solista acompanhado por alaúde.

Romance del Rey Moro & Granaína · Fahmi Alqhai · Arcángel · Accademia del Piacere · Luis de Narváez

O Vilancico também era feito sobre textos seculares, ou seja, não religiosos, mas tinha como forma definida a alternância entre estrofe e refrão. Além disso, era ligado à dança e a temas populares. Com o passar do tempo, o Vilancico passou a ser feito também sobre temas religiosos. Ou seja, até meados do século XV, a palavra Vilancico designava qualquer música vocal que não fosse um Romance.

Chacona: A la vida bona, de Juan Arañés

Juan de Encina

Dentre os compositores renascentistas espanhóis, pelo menos dois não podem deixar de ser citados: Juan de Encina e Tomás Luís de Victoria.

Encina, além de músico, foi poeta e dramaturgo.  Destaca-se entre os compositores    europeus de seu tempo por sua capacidade de equilibrar ritmo e expressividade. Aí já vemos a presença deste que é o mais forte traço da música ibérica: o ritmo.

Encina trabalhou na Corte do Duque de Alva, onde, a fim de entreter os membros da corte, apresentava com poemas, canções de amor e pequenas peças nas quais introduzia peças a 3 ou 4 vozes.

Tomás Luís de Victoria

O outro grande artista da música renascentista espanhola foi Tomás Luís de Vitória, que viveu entre 1548 e 1611. Victória se distingue de Encina por ter sido padre e por ter composto exclusivamente música sacra em estilo italiano. Victoria viveu em Roma por 25 anos, voltando `a Espanha com 32 anos de idade. Sua música é comparada à de Palestrina, ao lado de quem é tido como o maior compositor de música religiosa da Renascença. Seu estilo é profundamente religioso, estabelecendo forte ligação emocional e dramática com o texto.

VEXILLA REGIS, MORE HISPANO (4 v.) – Tomás Luis de Victoria (c.1548 – 1611)

Zarzuela

A Espanha também teve seu barroco, embora seus principais compositores sejam ignorados por nós. Na música para cravo destacaram-se os compositores Juan Batista Gomes, Juan Pujol, Juan Cabanilles e principalmente Francisco Correa de Arauxo.

O barroco foi marcado pelo nascimento da ópera, na Itália. Imediatamente a França seguiu a tendência, criando um tipo de ópera em estilo muito próprio. E o mesmo se deu na Espanha.   Um dos maiores dramaturgos espanhóis, Calderón de la Barca, criaria em 1657 um gênero dramático-musical tipicamente espanhol: a Zarzuela. Em geral em um ou dois atos, a Zarzuela do século XVII tinha tema  mitológico, com muitos coros e canções alternados por trechos falados.

Após Calderón, muitos outros dramaturgos e compositores escreveram Zarzuelas. A Zarzuela prosperou na Espanha por muitas décadas, porém nunca se impôs como um estilo internacional. E a partir de 1725, passaria a ceder espaço para a ópera italiana, que se tornava um sucesso irresistível em toda a Europa.

Celos aun del aire matan – Juan Hidalgo

Juan Crisóstomo Arriaga

Então, até o início do século XIX a Espanha produziria um imenso número de compositores, fossem de zarzuelas, de canções ou de música para guitarra, que faziam sucesso dentro do país, mas não conquistavam projeção internacional. A primeira esperança nesse sentido veio com Juan Crisóstomo Arriaga, nascido em Bilbao em 1806. Arriaga foi logo apelidado de o Mozart espanhol, por seu excepcional talento demonstrado desde muito cedo.

Bem jovem ele foi para a França, a fim de estudar no Conservatório de Paris. Aos 19 anos já havia composto uma ópera, uma sinfonia, um octeto, um noneto, uma missa, um Stabat Mater, um Salve Regina, 5 cantatas, inúmeras canções, e estudos para piano. Infelizmente com essa mesma idade ele viria a falecer, causando uma imensa frustração em todos que previam para ele uma brilhante carreira internacional. Sua música é de grande refinamento e beleza.

Felipe Pedrell

Morto Arriaga em 1826, o domínio musical italiano continuava. E a reviravolta que resultaria no nascimento de uma magnífica escola de composição nacional começou com um homem chamado Felipe Pedrell, que viveu entre 1841 e 1822.

Pedrell, além de compositor de grande mérito, foi musicólogo, escritor e editor responsável por iniciativas da maior importância.  Editou as obras completas de Victoria, um dicionário de músicos espanhóis, portugueses e latino-americanos, e é considerado o criador da moderna musicologia espanhola. E além de tudo isso, foi professor de três dos mais importantes compositores espanhóis nascidos na segunda metade do século XIX: Isaac Albéniz, Enrique Granados e Manuel de Falla. 

Isaac Albéniz viveu entre 1860 e 1909. Foi menino-prodígio ao piano, e estudou com Franz Liszt na Alemanha. Sua importância como compositor foi tão grande que exerceu forte influência sobre ninguém menos que Debussy e Ravel. De sua obra destacam-se um concerto para piano, um oratório chamado El Cristo, uma ópera notável, Pepita Jimenez, e um grande número de obras para piano solo. Destas, destaca-se sua suíte espanhola, opus 47.

Magda Tagliaferro – Albeniz : Sevilla (1934)

Enrique Granados

Enrique Granados foi contemporâneo de Albéniz: viveu entre 1867 e 1916. Estudou música em Paris, e além de compositor e pianista, foi um talentoso pintor, de estilo semelhante ao de Francisco Goya.

Como Albéniz, Granados compôs muito para o piano, mas tinha um estilo mais lírico, enquanto    o de Albéniz era mais enérgico.  Granados destacou-se como compositor orquestral. Seus poemas sinfônicos Divina Commedia e La nit del mort, foram pioneiros no sinfonismo espanhol. Também escreveu Zarzuelas.

Admirador que era do pintor Goya, Granados escreveu uma suíte para piano inspirada neste grande artista.

Manuel de Falla

O terceiro aluno destacado de Felipe Pedrell foi Manuel de Falla. Mais jovem que Albéniz e Granados, viveu entre 1876 e 1946. Como eles, foi excelente pianista. Com 31 anos de Falla foi para Paris, onde tornou-se amigo dos compositores Claude Debusy e Paul Dukas, e de inúmeros intelectuais e artistas da época.    Seria o compositor de sua geração que mais contribuiria para projetar internacionalmente a música de seu país. Procurou criar música moderna, do mais alto valor artístico, baseada no folclore de seu país, mas sempre esteve aberto à    influência francesa.

De sua obra    destacam-se a ópera La Vida Breve, a ópera de bonecos O Retábulo de Mestre Pedro, os Balés El Amor Brujo, e El Sombrero de Três picos”, a Cantata cênica Atlântida. Entre as obras puramente instrumentais destaca-se    Noites nos Jardins de Espanha, para piano e Orquestra.

Manuel de Falla : Noches en los jardines de España, for piano and orchestra (1911-15)

Quanto mais a gente conhece esse repertório, menos entende porque muita gente tem a percepção de que a música espanhola ocupa um papel periférico na   música erudita europeia. É uma música, aliás, muito próxima do nosso gosto brasileiro, pois afinal, muitas de nossas raízes são ibéricas.

Espero que tenha gostado deste post.

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Saudações Musicais!

Compositores Britânicos

Começo a postagem de hoje relembrando meu tempo de estudante. Eu sempre tive um lado meio, digamos do contra. Enquanto todo mundo corria para um lado, eu gostava de, de vez em quando, correr para o lado onde ninguém estava indo. Isso quer dizer que eu acabava pesquisando algumas coisas que chamavam a atenção de muito pouca gente. Uma dessas minhas pesquisas envolveu os compositores britânicos.

Como estudante de música, eu praticamente só tocava obras de compositores alemães, franceses, italianos, russos e brasileiros. Até que em um belo dia comecei a pensar: e os compositores ingleses? Por que ninguém fala deles? Por que nunca ouço suas obras?

Quando perguntava isso a colegas ouvia como resposta que os compositores ingleses eram em geral desinteressantes… que com exceção de Henry Purcell e Elgar, não havia muito mais o que ouvir.

Eu nunca consegui acreditar nessas respostas, e assim, saí à luta. E descobri muitos compositores britânicos pra lá de interessantes. E um pouco da música desses compositores muito pouco conhecidos eu vou compartilhar com vocês hoje.

Malcolm Arnold

O primeiro deles é Malcolm Arnold, que nasceu em Northampton em 1921 e faleceu em 2006.  Arnold foi trompetista, ocupando uma das cadeiras da Orquestra Filarmônica de Londres. Em 1948, com 27 anos de idade, ele deixou a orquestra para dedicar-se exclusivamente à composição.

A maior parte de sua obra foi escrita para orquestra, destacando-se 9 sinfonias, compostas entre 1951 e 1982. Além disso escreveu muita música para cinema.

Seu estilo mostra influências de Sibelius e Berlioz. Esse comentário pode soar um pouco estranho para que conhece bem a obra desses dois compositores. Mas isso fica fácil de entender quando ouvimos um comentário muito frequente sobre sua obra, que diz: “existem dois Malcolm Arnolds: um leve e um pesado”

Claro que esse é um comentário simplista, mas que tem uma base na verdade. Acontece que Arnold era capaz de escrever música da maior densidade dramática, bem como expressar muito humor e sarcasmo.

Aliás, aqui e ali Arnold se permitia a liberdade de tocar os universos da música pop, do jazz e da música hollywoodiana, coisa que faz dele um compositor cada vez mais atual.

Vamos conferir esses aspectos de sua obra na interessantíssima Serenata para Pequena Orquestra, opus 26. Ela foi escrita em 1950, quando o autor tinha 29 anos. Tem 3 movimentos: Allegretto, Andante com moto e Allegro Vivace.

Malcolm Arnold : Serenade for small orchestra Op. 26 (1950).

Arnold Bax

Aliás, muitos desses compositores foram praticamente ignorados fora da Inglaterra durante suas vidas por serem considerados muito conservadores, distantes das experiências ousadas de artistas como John Cage ou Stockhausen. Mas esse julgamento talvez tenha sido severo demais, e sob esse aparente conservadorismo existe um pensamento musical muito rico e digno de ser ouvido.

Continuemos então com Arnold Bax, que viveu entre 1883 e 1953, ou seja, pertenceu a uma geração anterior à de Malcolm Arnold. Como este, Bax revela também a influência de Sibelius. A maior parte de sua música é muito densa, em harmonia e contraponto.

Sua obra é bastante grande, incluindo sete sinfonias, concertos, música de câmara, coral e música para cinema.

A obra de Bax para piano também é muito interessante. Bax era apaixonado pela Rússia e por sua cultura. Ele visitou o país em 1910, assim como aconteceu com diversos artistas em vários países europeus, encantou-se com os bailados russos que eram apresentados naquela década.

Iris Loveridge – Arnold Bax: Two Russian-Tone Pictures: National Dance (Gopak)

Edmund Rubbra

O próximo compositor que conheceremos é Edmund Rubbra, que viveu entre 1901 e 1986. Rubbra nasceu em Northhampton, mesma cidade natal de Malcolm Arnold. Trabalhou como professor, pianista e crítico musical, e só depois de muito tempo sua música passou a apresentar um estilo próprio, independente dos maiores compositores britânicos de seu tempo, como Bax ou Holst.

Um marco de sua evolução estilística foi sua 1ª Sinfonia, escrita em 1937, quando Rubbra já tinha 36 anos.

Sua obra inclui 11 sinfonias, concertos para piano, violino, viola, quatro quartetos de cordas, e uma boa quantidade de música sacra, como missas e motetos.

Rubbra talvez seja o menos conhecido dos compositores ingleses que aqui apresentamos. Contudo sua música é de grande qualidade e expressividade. Alguns críticos costumam dizer que ele é um típico compositor para ser gravado, pois sua música só revela seus segredos após ser ouvida várias vezes.

https://www.youtube.com/watch?v=Lctd33jY3bU
Edmund Rubbra: Lyric Movement op.24 (1929).

“Movimento Lírico” Rubbra não poderia ter escolhido um título mais apropriado. A música nos envolve num clima de sonho e facilmente nos tira do mundo real.

Sir Arthur Bliss

O último compositor que ouviremos é aquele que foi considerado o sucessor de Edward Elgar: Sir Arthur Bliss.

Imensamente festejado e homenageado em seu país, Bliss é praticamente desconhecido no Brasil. Sua música é extremamente brilhante e direta, causando forte impacto em quem a ouve pela primeira vez.

Dentre as obras de Bliss podem ser citadas como principais a ópera The Olympians, seus três bailados, Checkmate, Miracle in the Gorbals, Adam Zero, a trilha sonora do filme Things to Come, e sua Colour Sympony.

Porém dentre tudo isso o que mais me impressiona é o “Furiant” para viola e piano, em que os dois instrumentos parecem soar com a energia de uma orquestra sinfônica.

Vamos ouvir e tenho certeza de que vocês concordarão comigo.

Viola Sonata: III. Furiant: Molto allegro.

Hoje mostrei um pouquinho da enorme injustiça que se faz a muitos compositores britânicos espetaculares que são muito pouco ouvidos no Brasil, e aliás, também pouco ouvidos no continente europeu.

Será que essa é uma música que só cativa ouvidos britânicos? Gostaria de saber a opinião de vocês. Espero que tenham gostado deste post.

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Saudações Musicais!

A Família Mozart

Anonymous – Wolfgang Amadeus Mozart and Thomas Linley in the family of Gavard des Pivets in Florence.

João Jorge Leopoldo Mozart, nascido na cidade austríaca de Augsburgo em 1719, era um homem religioso. Na meia-idade, acreditou estar presenciando um milagre. São suas as seguintes palavras, escritas em uma carta datada de julho de 1768, quando tinha 49 anos de idade:

“Eu devo essa tarefa a Deus Todo Poderoso, senão eu serei a mais ingrata de todas as criaturas. E se for meu dever convencer o mundo da veracidade deste milagre, assim será, especialmente hoje, quando as pessoas estão ridicularizando o que quer que seja chamado de milagre, e negando todos os milagres”.

Esse milagre, que ainda segundo ele “Deus deixou nascer em Salzburgo”, era o imenso e precoce talento musical demonstrado por seus dois filhos, Maria Ana e João Crisóstomo Lupicínio Amadeus Mozart.

O Pai

Leopoldo era um intelectual, o único a viver em Salzburgo em seu tempo. Apesar de não pertencer a uma família aristocrática, teve acesso a uma boa educação, ao frequentar uma escola Jesuíta em Augsburgo, sua cidade natal. E já em Salzburgo, para onde se mudou com 18 anos de idade, ingressou na Universidade Beneditina onde graduou-se em filosofia.

Embora religioso, não era profundamente devoto. Sua educação racional fez dele um homem bastante sóbrio e crítico. Sua religiosidade era temperada pelas ideias do iluminismo que pouco a pouco ganhavam a Europa.

Porém, quando se deu conta do assombroso talento de seus filhos, sentiu-se como que atingido por um raio. Aquilo foi para ele uma revelação divina, algo que mudou substancialmente sua maneira de ver a vida. Foi então que ele decidiu entregar-se totalmente à tarefa que citei há pouco; promover o desenvolvimento daqueles talentos; aquilo tornou-se para ele era uma obrigação para com Deus.

Obras

Segundo sua filha Maria Anna, em 1760, quando estava com 41 anos e no auge de sua criatividade, Leopoldo deixou de lado as aulas de violino e a composição; todo o tempo que não era usado para realizar as suas obrigações profissionais, ele dirigia para a educação musical dos dois pequenos.

Nessa altura Leopoldo já havia escrito muita música. Dentre tudo o que conhecemos dele há muita música de ocasião, ou seja, peças muito simples encomendadas para situações específicas da corte, como festas ou cerimônias civis e religiosas. A qualidade dessa música é sempre mediana, como era de se esperar. Mas há também algumas muito belas, como esta que nosso caro leitor pode ouvir, clicando no link abaixo.

Missa Brevis en do (Kyrie – Gloria) – Léopold Mozart (1719-1787) – CCVS.

Leopoldo também escreveu um grande número de sinfonias, mais de 80, muitas das quais estão perdidas. Embora a maioria delas seja música bastante convencional, outras podem ser apreciadas ainda hoje com prazer. Aliás, até os anos setenta do século passado, algumas delas figuravam no catálogo de obras de seu filho Amadeus.

Vocês sabem, caros leitores, de toda a obra de Leopoldo, o que mais se grava? As obras que pertencem à categoria de… pitorescas.

Aqui vão alguns exemplos: a Sinfonia dos Brinquedos, em que são utilizados instrumentos de brinquedos, como tambores, cornetas ou matracas. Ou a Sinfonia da Caça, em que a escrita musical imita galopes, pássaros, latidos, e a qual podem ser introduzidos sons de apitos e tiros; ou uma sinfonia intitulada “O Casamento Campestre”, nas quais se ouve os sons de instrumentos rústicos como gaitas de foles e violas de roda.

Leopold Mozart: Sinfonia dos Brinquedos

Maria Anna

Maria Anna, a filha mais velha de Leopoldo, era tão talentosa quanto o pequeno Amadeus. Fez várias viagens com seu pai e irmão, exibindo sua técnica e musicalidade ao piano para plateias de nobres e poderosos em cidades como Munique, Paris e Londres. Porém, aquela época não favorecia o sucesso professional das mulheres, e a partir de 1769, quando completou 18 anos, Maria Anna passou a exibir sua musicalidade apenas dentro de casa, enquanto seu irmão Amadeus viajava e afirmava-se como compositor.

Houve um momento em sua juventude que Maria Anna começou a compor, o que se sabe pela correspondência que trocava com seu irmão; irmão, que aliás, a adorava e encorajava profundamente. Mas infelizmente nenhuma de suas partituras sobreviveu.

Ela casou-se aos 33 anos de idade com um magistrado da cidade de Saint Gilegen e teve três filhos, tornando-se uma dona de casa.

Em 1801, aos 50 anos, ficou viúva, retornando a Salzburgo com seus filhos, para uma vida simples e pacífica. Lá manteve-se ativa como professora de piano, e muitas pessoas importantes da cidade encaminhavam seus filhos para estudar com a irmã do grande Amadeus Mozart. Faleceu solitária e pobre em 1829, com 78 anos de idade.

Amadeus

Todo mundo já deve ter ouvido falar que o pequeno Amadeus Mozart compôs sua primeira música aos 5 anos. Muita gente duvida, mas não é mentira não, caros leitores. Ele realmente começou a escrever pequenos minuetos e outras peças simples nessa idade, mas… com certeza, a mão de seu pai Leopoldo o ajudava a segurar a caneta – ou melhor, a pena. Aliás, todas partituras que Amadeus Mozart escreveu até completar 14 anos, são repletas de reparos e correções feitas com a caligrafia de seu pai.

Este é um minueto que ele escreveu aos cinco anos:

Mozart Menuet No.1 K.1 (TAKE 1) 1st Composition 5 YEARS OLD.

A evolução de Amadeus foi rápida. Com apenas 8 anos ele escreveu sua 1ª sinfonia.

Abaixo o 1º movimento de sua Sinfonia nº1, catalogada com o número 16 no catálogo de Köechel. Aqui sim estamos diante de não mais um minueto simplesinho, mas de uma peça de envergadura nem maior.

Wolfgang Amadeus Mozart “Sinfonía n.º 1 en mi bemol mayor, KV. 16”

Francisco

Assim como seu pai Leopoldo, Amadeus Mozart teve vários filhos, e só dois chegaram à idade adulta. Dos dois só um seguiu a carreira musical: Francisco Xavier Mozart, que nasceu em 1791, poucos meses antes da morte do pai, e faleceu em 1844, com 53 anos de idade.

Francisco estudou música com os melhores mestres Vienenses: Salieri, o grande compositor da corte; Hummel que havia sido aluno de seu pai; Albrechstsberger, que havia sido professor de Beethoven; e Sigismundo Neukomm, que fora aluno de Haydn, e viveu no Rio de Janeiro, onde conheceu o nosso Padre José Maurício Nunes Garcia.

Francisco Xavier Mozart também demonstrava um grande talento musical. Salieri declarou que ele certamente desenvolveria uma carreira comparável à de seu pai. E com efeito, Francisco começou a compor muito jovem. Pianista e violinista, aos treze anos fez sua primeira apresentação pública.

Mas não era fácil ser filho de quem era. Francisco, apesar de muito bom músico, sempre subestimava seu próprio talento, e temia que suas obras fossem sistematicamente comparadas com as de seu pai.

Além disso, foi um daqueles compositores que viveu numa época um tanto difícil: a passagem do classicismo para o romantismo, sob a sombra de Beethoven. Em alguns momentos Francisco Xavier ainda é bastante clássico. Em outros, já soa claramente romântico.

Franz Xaver Wolfgang Mozart – Piano Concerto No.2 in E-flat major, Op.25 (1818).

Mozarteum

Francisco viveu 20 anos numa cidade alemã chamada Lemberg, lecionando, fazendo recitais, e regendo. Foi o fundador da 1ª escola de música da cidade. Aos 47 anos voltou para Viena, e posteriormente mudou-se para Salzburgo, onde foi nomeado “mestre de capela” do Mozarteum.

O Mozarteum de Salzburgo foi uma associação criada por volta de 1840, graças aos esforços da viúva de Amadeus Mozart, que tinha como missão “o refinamento do gosto musical, em relação à música sacra e também à música de concerto”. As atividades da associação, que incluía concertos com orquestra, tornou-se no século XIX o centro da vida musical da cidade. A associação cresceu e entre 1910 e 1914 construiu um prédio com duas salas de concerto, e hoje quando se fala no Mozarteum de Salzburgo, refere-se a elas.

Linhagem

Como eu disse há pouco, Amadeus Mozart teve dois filhos que atingiram a idade adulta. O irmão mais velho de Francisco Xavier era Carlos Tomás Mozart, que viveu entre 1784 e 1858.

Carlos estudou piano em Viena quando jovem, e demonstrava muito talento. Seus interesses, no entanto, oscilavam entre o piano e outras atividades. Em 1810, aos 26 anos, ele desistiu definitivamente da música como profissão, e tornou-se um oficial a serviço do Vice-Rei de Nápoles em Milão. Desde 1797 ele estava radicado na Itália e de lá nunca mais saiu.

Nem Carlos nem Francisco tiveram filhos. Terminou com eles a descendência direta de um dos maiores músicos que a humanidade gerou: João Crisóstomo Lupicínio Amadeus Mozart. E se podemos hoje nos encantar com sua música, não podemos deixar de agradecer seu pai, João Jorge Leopoldo Mozart, que cuidou muito bem para que o talento de seu filho desabrochasse.

Espero que tenha gostado deste post.

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Saudações Musicais!

Compositores Injustiçados: Pachelbel

Johann Pachelbel

Começo o texto de hoje lhe fazendo uma pergunta: você gosta de J. S. Bach? Ou melhor, você gosta da música de J. S. Bach? Acredito que sim; se está neste site é porque gosta ou está interessado em conhecer música clássica, ou música de concerto. E nesse campo, J. S. Bach é certamente uma unanimidade.

Afinal, difícil não gostar de algo assim…

Pachelbel – Cantata ‘Halleluja! Lobet Den Herrn’

É, mas essa não é de Bach. Parece não é, caro leitor? Mas não é… é de Johann Pachelbel!

Ah, ele então copiou Bach?

Não, porque Pachelbel nasceu nada menos que 32 anos ANTES de J. S. Bach.

Foi Bach quem se inspirou nele, um compositor injustamente muito pouco conhecido.

E por que ele é injustiçado?

Porque apesar de ter tido um importantíssimo papel na evolução da música alemã, deixando uma obra imensa e de altíssima qualidade, influenciando até mesmo um dos maiores gênios musicais de todos os tempos, nada dele é amplamente conhecido… a exceção, que confirma a regra é a peça que você pode ouvir clicando abaixo, com a Orquestra Barroca Tafelmusic.

Cânon em Ré Maior

O Canon em Ré maior é a única obra de Johann Pachelbel amplamente conhecida.

Todo mundo já ouviu! Ela foi gravada centenas de vezes a partir dos anos 60, em coletâneas de peças barrocas; tornou-se um “must” em cerimônia de casamento em todo o mundo. Um verdadeiro símbolo do que é “barroco” em música.

É realmente uma peça delicada e encantadora. Mas um compositor do nível de Pachelbel não merece ser conhecido apenas por uma obra. Aliás, para ser exato, por MEIA obra, visto que na partitura original de Pachelbel esse canon é complementado por uma outra peça, um 2º movimento, que nunca é tocado.

Você pode ouvi-la na íntegra, clicando na imagem abaixo. A execução é da Orquestra Barroca Tafelmusik.

Canon and Gigue in D Major, P. 37: I. Canon “Pachelbel’s Canon”

Família Bach

Vamos então nos valer do post de hoje para conhecer um pouco mais da música desse compositor tão refinado.

Como disse há pouco, a música de Pachelbel influenciou notadamente a música de J. S. Bach. Mas essa influência é mais intensa do que podemos pensar.

Por volta de 1684, Pachelbel, então com 31 anos de idade, foi morar na região de Erfurt e Eisenach, conheceu pessoalmente e tornou-se amigo de ninguém menos que Johann Ambrosius Bach, pai de Johan Sebastian Bach; mais ainda: eles se tornaram compadres, pois Ambrosius convidou Pachelbel para ser padrinho de batismo de sua filha Johann Juditha; e ainda mais: tornou-se professor de Johann Christoph Bach, irmão mais velho de Johann Sebastian, que estava para nascer na ocasião.

Reflexões sobre a Morte

Pachelbel era talvez o mais admirado organista alemão daquela época. Profundo conhecedor do instrumento, foi para ele que criou a maior parte de sua obra: mais de 200 peças.

Clicando na imagem abaixo, podemos ouvir algumas peças para órgão, que fazem parte de uma obra muito particular chamada Musicalische Sterbens-Gedancken, o que em português podemos traduzir como “Reflexões Musicais sobre a Morte”.

Pachelbel a escreveu com 28 anos, logo após a morte de sua primeira filha, vítima de uma epidemia devastadora.

Não se trata de música fúnebres, mas de peças escritas a partir de melodias luteranas, uma delas chamada justamente “Alle Menschen müssen sterben”: todos os homens haverão de morrer.

J. Pachelbel – Alle Menschen müssen sterben

Além de peças para órgão, Pachelbel compôs muitas obras para vozes, dentre as quais destacam-se os motetos: são obras para dois coros, discretamente acompanhados por baixo contínuo.

Abaixo está o link para um deles chamado Der Herr is König und herrlich geschmückt – O Senhor é Rei em deslumbrante majestade.

Procure notar durante a audição os momentos em que todos cantam juntos, bem como quando as vozes dialogam. Esse diálogo é particularmente fácil de perceber nesta gravação quando ocorre entre vozes masculinas e femininas.

Johann Pachelbel- Der Herr ist König und herrlich geschmückt

Deleite Musical

Assim como J. S. Bach, Pachelbel empenhou grande parte de seu tempo e energia trabalhando com música religiosa, para órgão, ou para vozes, como vimos até aqui.

Mas também como Bach, não deixou de produzir música de câmara secular.

Embora seja uma parte menor de sua obra, não é menor em qualidade.

Acredita-se que uma boa parte da música de câmara instrumental que Pachelbel compôs se perdeu; do que restou o que mais se destaca são suas suítes para 2 violinos e baixo contínuo, às quais ele deu o nome de Musicalische Ergötzung – “Deleites Musicais”.

Cada uma dessas suítes é composta por uma sonata, seguida por diversas danças: Alemanda, Gavota, Corrente, Aria, Sarabanda, Giga e um Adagio Final.

Johann Pachelbel: Partita II in C minor (Musicalische Ergötzung)

Relembrando: “Deleite Musical” é realmente o título da obra, dado pelo próprio compositor, para as suas suítes para dois violinos e baixo contínuo.

Depois de ouvir esse elegantíssimo desfile de música da maior finesse e bom gosto, tenho certeza de que você concordará comigo que o sr. Pachelbel não merece ser conhecido apenas pelo seu Canon em ré maior . Uma peça muito agradável, mas que representa muito pouco da sua grandeza artística.

Espero que tenha gostado deste post.

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Saudações Musicais do maestro J. M. Galindo.

Debussy e o Oriente

Claude Debussy

No final do século XIX, o romantismo musical já mostrava sinais de desgaste. Embora muitos compositores de grande estatura tenham se mantido fiéis a ele até o começo do século XX, alguns outros procuravam por novas alternativas, na forma musical e na sonoridade.

Inspirar-se em fontes musicais que haviam por muito tempo sido excluídas da música europeia era um dos caminhos possíveis, e um compositor que percebeu isso com muita clareza foi o francês Claude Debussy.

Debussy começou a estudar piano com sete anos de idade, e logo demonstrou mostrou enorme talento. Poderia tranquilamente ter seguido com sucesso a carreira de pianista, mas apaixonou-se pela criação musical e decidiu tornar-se compositor.

Estudou no Conservatório de Paris, e escreveu suas primeiras peças com dezessete anos de idade, sempre contestando as normas acadêmicas. Não gostava de ópera italiana, flertou com o estilo de Wagner, mas logo o abandonou. Estava sempre à procura de sua personalidade como compositor.

Novas Sonoridades

Exposition Universelle de Paris 1889

Pois bem, caro leitor, uma das primeiras experiências que lhe abriu as portas para as novas sonoridades que procurava aconteceu em 1889 – portanto quando ele estava com 27 anos. A tal experiência aconteceu numa das visitas que ele fez à magnífica Exposição Universal realizada em Paris naquele ano.

Comemorava-se os cem anos da queda da Bastilha, símbolo do início da Revolução Francesa. De maio a outubro daquele ano, 32 milhões de pessoas visitaram as diversas atrações oferecidas, como a recém-construída Torre Eiffel, o Diamante Imperial, maior do mundo até então, exposição de locomotivas de última geração, shows diversos como uma representação do “Far West” norte-americano, e por aí afora.

Pois bem, com tudo isso, o que deixou Claude Debussy de boca aberta foi um conjunto musical vindo da Indonésia: um Gamelão!

Gamelão

O Gamelão é um grande conjunto formado basicamente por instrumentos de percussão, principalmente gongos e pratos dos mais variados tipos e tamanhos. E importante: não são afinados segundo os padrões europeus.

Debussy ficou encantado com o que ouviu, chegando a comentar que perto daquilo, os acordes ocidentais pareciam música de criança.

Esses sons da ásia marcaram o compositor para sempre; em 1903 ele iria compôr uma peça para piano chamada Pagodes, numa referência às habitações indonésias que levam esse nome.

Vamos começar nossa audição ouvindo e comparando uma autêntica peça de Gamelão da ilha de Java, com Pagodes, de Debussy.

Orquestra de Gamelão e dança tradicional de Ubud.
Estampes, L. 100: I. Pagodes · Noriko Ogawa.

Escalas

Pois bem, como eu disse há pouco, Debussy ainda muito jovem se encantou com a música de Liszt e Wagner, que era o que havia de mais moderno na 2ª metade do século XIX; contudo, esse encantamento logo se foi, e ele abriu-se para novas possibilidades.

A música de Gamelão trouxe vários elementos que ele passou a usar com frequência em várias obras. Por exemplo, a escala que chamamos de “pentatônica”, ou seja, de cinco notas. A escala básica ocidental, nossa velha conhecida, tem 7 notas, do re mi fa sol la si…

Outra escala que Debussy passou a usar com o objetivo de se afastar da sonoridade europeia foi a escala de tons inteiros.

Outro ponto interessante a ser notado, nessa busca pelo afastamento do romantismo musical, é o que lemos na partitura dessa peça, Pagodes. O próprio Debussy escreveu: “tocar quase sem nuance”.

Nuance, no jargão musical, se refere à intensidade de som. Assim, Debussy quer que a peça seja tocada praticamente no mesmo volume de som, sem “crescendos” ou “diminuendos”. Assim, a ênfase cai sobre os timbres, as cores sonoras, eliminando os excessos expressivos.

Outra informação: Pagodes é na verdade a 1º de uma sequência de três pecas. A 2ª se chama La Soirée dans Grenade, ou em português, a Noite em Granada.

Graças a essa escala, Debussy aqui também se afasta do padrão europeu. Granada, como sabemos, é a região da Espanha que talvez tenha retido a maior influência árabe da Península Ibérica.

Granada

O grande compositor espanhol Manuel de Falla disse sobre a peça: “Não há um único compasso nesta peça que tenha sido retirado do folclore espanhol, mas mesmo assim toda a composição, nos seus mínimos detalhes, retrata admiravelmente a Espanha.”

Vamos então ouvir “A Noite em Granada”, com Noriko Ogawa ao piano.

Estampes, L. 100: II. La soiree dans Grenade · Noriko Ogawa

Estilos

Duas obras em que Debussy consegue sem qualquer dúvida manifestar sua forte personalidade musical, transcendendo o estilo romântico, e conseguindo isso em grande parte pela utilização de elementos musicais não europeus.

A terceira e última peça da suíte chamada “Estampas” chama-se “Os Jardins sob a Chuva”. Esta não tem nenhum elemento não europeu, e procura descrever um jardim da cidade de Orbec, na Normandia, durante uma violenta tempestade. Há muitos elementos descritivos – o vento, os trovões, as gotas de chuva – entremeados com melodias folclóricas.

Na Idade Média, durante a expansão do Cristianismo, toda a música sacra era controlada pela Igreja de Roma; especialmente no período em que os árabes foram sendo expulsos da Europa, a sua música se foi com eles.

A influência árabe e manteve na obra dos grandes compositores espanhóis, como Granados ou Albeniz, e no leste europeu, a música folclórica foi admiravelmente trabalhada por Bela Bartok.

Argélia

Em 1908, quando estava com 34 anos, Holst viajou para a Argélia, por recomendação médica. Precisava de um clima menos frio. Essa viagem inspirou uma suíte para piano, formada por três peças. A 1ª peça ele chamou de Dança Oriental, a 2ª, simplesmente de Dança, e a 3ª, de “Nas Ruas de Ouled-Nail”. No início da 1ª peça podemos ouvir claramente a escala árabe…

A 2ª peça é bem mais sutil – a matéria prima oriental está bastante diluída na harmonia ocidental. E a 3ª peça, nas Ruas de Ouled-Nail, tem um título que precisa ser explicado. Ouled Nail é uma confederação de tribos árabes que vivem em montanhas da Argélia que têm o mesmo nome.

Essas tribos desenvolveram um estilo musical próprio, e uma variação específica da dança do ventre. Os dançarinos e dançarinas apresentavam-se com roupas e joias exuberantes, que chamava a atenção dos turistas.

Tudo isso está na música de Holst: uma base melodia sinuosa remete à dança do ventre, e a orquestração é exuberante como a indumentária dos dançarinos.

Não se trata, caro leitor, de música pitoresca, exótica, como as danças chinesas e árabes dos balés de Tchaikovsky. Aqui, os elementos musicais árabes são usados com verdadeira intenção de criar uma música nunca antes ouvida. Para o ano de 1908 era sem dúvida uma obra muito moderna.

Holst ‘In the Street of Ouled Nails’ (‘Beni Mora’ Oriental Suite)

Carl Nielsen

Como eu disse há pouco, vamos para os frios países do norte, e depois da Inglaterra rumaremos para a Dinamarca.

O mais célebre compositor dinamarquês foi Carl Nielsen, e também ele flertou com a música do oriente.

Esse trecho chama-se “O Mercado de Ispahan”, e faz parte da música que Nielsen compôs em 1919 para a peça teatral “Aladdin”.

Torvet i Isfahan (The Marketplace in Ispahan)

Aladdin

Nesta cena da peça, os personagens chegam ao mercado. Imagine que é você quem está lá, num grande mercado árabe ao ar livre. Imagine quantos pequenos grupos musicais estão distribuídos pela praça, tocando suas danças e canções. Você começa a ouvir um deles, e à medida que anda começa a ouvir outro.

Suas melodias antagônicas se misturam, e como isso não bastasse você começa a ouvir um terceiro grupo. Tudo parece virar uma cacofonia, quando se escuta um quarto grupo. À medida que vai caminhando a cacofonia vai se rarefazendo e tudo termina com a melodia do primeiro grupo.

Pois foi esse efeito inusitado que Nielsen procurou criar. Ele dividiu a orquestra em quatro grupos: o primeiro formado por instrumentos de sopro de madeira e um triângulo; o segundo formado pelas cordas; o terceiro por trompas, trompetes e tímpanos; e o quarto por dois flautins e um gongo.

Como vimos, Nielsen dividiu a orquestra em quatro grupos que superpõem quatro melodias completamente diferentes, que não se combinam, criando assim um efeito espacial, como se estivéssemos de fato caminhando pela praça do mercado.

Para encerrar, ouviremos a Dança de Negros, enérgica, contagiante, e com uma exuberante orquestração.

Nielsen: Aladdin – Concert Suite – 7. Negro Dance · Gothenburg Symphony Orchestra.

Essa foi a Dança de Negros, parte da trilha sonora da peça teatral Aladdin, escrita por Carl Nielsen em 1919.

Espero que tenha gostado deste post.

Ah, e não vá embora sem antes deixar um comentário!

Saudações Musicais do maestro J. M. Galindo.