Começo o texto de hoje lhe fazendo uma pergunta: você gosta de J. S. Bach? Ou melhor, você gosta da música de J. S. Bach? Acredito que sim; se está neste site é porque gosta ou está interessado em conhecer música clássica, ou música de concerto. E nesse campo, J. S. Bach é certamente uma unanimidade.
Afinal, difícil não gostar de algo assim…
É, mas essa não é de Bach. Parece não é, caro leitor? Mas não é… é de Johann Pachelbel!
Ah, ele então copiou Bach?
Não, porque Pachelbel nasceu nada menos que 32 anos ANTES de J. S. Bach.
Foi Bach quem se inspirou nele, um compositor injustamente muito pouco conhecido.
E por que ele é injustiçado?
Porque apesar de ter tido um importantíssimo papel na evolução da música alemã, deixando uma obra imensa e de altíssima qualidade, influenciando até mesmo um dos maiores gênios musicais de todos os tempos, nada dele é amplamente conhecido… a exceção, que confirma a regra é a peça que você pode ouvir clicando abaixo, com a Orquestra Barroca Tafelmusic.
Cânon em Ré Maior
O Canon em Ré maior é a única obra de Johann Pachelbel amplamente conhecida.
Todo mundo já ouviu! Ela foi gravada centenas de vezes a partir dos anos 60, em coletâneas de peças barrocas; tornou-se um “must” em cerimônia de casamento em todo o mundo. Um verdadeiro símbolo do que é “barroco” em música.
É realmente uma peça delicada e encantadora. Mas um compositor do nível de Pachelbel não merece ser conhecido apenas por uma obra. Aliás, para ser exato, por MEIA obra, visto que na partitura original de Pachelbel esse canon é complementado por uma outra peça, um 2º movimento, que nunca é tocado.
Você pode ouvi-la na íntegra, clicando na imagem abaixo. A execução é da Orquestra Barroca Tafelmusik.
Família Bach
Vamos então nos valer do post de hoje para conhecer um pouco mais da música desse compositor tão refinado.
Como disse há pouco, a música de Pachelbel influenciou notadamente a música de J. S. Bach. Mas essa influência é mais intensa do que podemos pensar.
Por volta de 1684, Pachelbel, então com 31 anos de idade, foi morar na região de Erfurt e Eisenach, conheceu pessoalmente e tornou-se amigo de ninguém menos que Johann Ambrosius Bach, pai de Johan Sebastian Bach; mais ainda: eles se tornaram compadres, pois Ambrosius convidou Pachelbel para ser padrinho de batismo de sua filha Johann Juditha; e ainda mais: tornou-se professor de Johann Christoph Bach, irmão mais velho de Johann Sebastian, que estava para nascer na ocasião.
Reflexões sobre a Morte
Pachelbel era talvez o mais admirado organista alemão daquela época. Profundo conhecedor do instrumento, foi para ele que criou a maior parte de sua obra: mais de 200 peças.
Clicando na imagem abaixo, podemos ouvir algumas peças para órgão, que fazem parte de uma obra muito particular chamada Musicalische Sterbens-Gedancken, o que em português podemos traduzir como “Reflexões Musicais sobre a Morte”.
Pachelbel a escreveu com 28 anos, logo após a morte de sua primeira filha, vítima de uma epidemia devastadora.
Não se trata de música fúnebres, mas de peças escritas a partir de melodias luteranas, uma delas chamada justamente “Alle Menschen müssen sterben”: todos os homens haverão de morrer.
Além de peças para órgão, Pachelbel compôs muitas obras para vozes, dentre as quais destacam-se os motetos: são obras para dois coros, discretamente acompanhados por baixo contínuo.
Abaixo está o link para um deles chamado Der Herr is König und herrlich geschmückt – O Senhor é Rei em deslumbrante majestade.
Procure notar durante a audição os momentos em que todos cantam juntos, bem como quando as vozes dialogam. Esse diálogo é particularmente fácil de perceber nesta gravação quando ocorre entre vozes masculinas e femininas.
Deleite Musical
Assim como J. S. Bach, Pachelbel empenhou grande parte de seu tempo e energia trabalhando com música religiosa, para órgão, ou para vozes, como vimos até aqui.
Mas também como Bach, não deixou de produzir música de câmara secular.
Embora seja uma parte menor de sua obra, não é menor em qualidade.
Acredita-se que uma boa parte da música de câmara instrumental que Pachelbel compôs se perdeu; do que restou o que mais se destaca são suas suítes para 2 violinos e baixo contínuo, às quais ele deu o nome de Musicalische Ergötzung – “Deleites Musicais”.
Cada uma dessas suítes é composta por uma sonata, seguida por diversas danças: Alemanda, Gavota, Corrente, Aria, Sarabanda, Giga e um Adagio Final.
Relembrando: “Deleite Musical” é realmente o título da obra, dado pelo próprio compositor, para as suas suítes para dois violinos e baixo contínuo.
Depois de ouvir esse elegantíssimo desfile de música da maior finesse e bom gosto, tenho certeza de que você concordará comigo que o sr. Pachelbel não merece ser conhecido apenas pelo seu Canon em ré maior . Uma peça muito agradável, mas que representa muito pouco da sua grandeza artística.
Espero que tenha gostado deste post.
Ah, e não vá embora sem antes deixar um comentário!
Saudações Musicais do maestro J. M. Galindo.
Amei Maestro!!
Sou um apaixonado por Bach… ele me conecta com o Divino…
Acho que ele canalizava energia de mundos mais elevados , não deve ser apenas inspiração, devia possuir uma conexão especial.
Vale mencionar que Plachelbel , também devia ser um iniciado , na mesma frequência …
Obrigado Maestro pela sua generosidade e sensibilidade!
Um forte abraço!
Há mais de 50 anos que ouço música clássica e confesso não ter ouvido nada de Pachelbel até então. Como pude perder essa preciosidade, esse verdadeiro deleite? Bem, nunca é tarde para reparar tal erro.
Muito grato, Maestro.
Exatamente, Osmar, nunca é tarde. A boa música está aí para nos acompanhar por toda a vida. Desfrute! Um abraço!
Maestro, alguns meses atrás, buscando passar da minha superficialidade, quis ouvir outras músicas da Albinoni. Outras além do adágio. Perguntei- me , por
Que alguns compositores ficaram conhecidos por apenas uma ou outra obra?
Talvez, a música clássica passe, também, por um crivo midiático. Espero que divulgações como está, ultrapasse barreiras. Parabéns, Maestro
Sim, a questão é mesmo midiática. Não podemos apenas esperar que a mídia nos mostre tesouros da música de concerto. Ela simplesmente não faz mais isso. O jeito é procurarmos. Albinoni foi um excelente compositor, e deixou belíssimas obras. E o referido Adagio aliás, nem é dele! É de Remo Giazotto, musicólogo italiano que viveu no século XX. Um abraço!
Maestro, estou aqui ouvindo encantada todas as peças. Realmente eu ignorava tudo sobre este compositor de tanta sensibilidade, com exceção de parte do Cânon em Ré menor (e agora sei o seu nome) . Nessas horas eu honestamente não entendo como alguém pode não se encantar com a música clássica. Muito obrigada!!
Que bom, Marilia, deleite-se! Um abraço!
Concordo com o comentário do Alexandre!
Muito bom conhecer mais de grandes artistas. Vou ouvir com atenção essas obras citadas.
Oi Anderson. Minha idéia para este site não é apenas postar textos, mas além disso fornecer links do Youtube para que os leitores possam ouvir as peças que eu cito. Acho isso fundamental! Espero que você goste. Um abraço.
Querido maestro, boa tarde! Desde garoto eu decidi e aprendi que, se queremos conhecer mais sobre música temos que procurar, temos que garimpar, temos que sair da superfície e mergulhar porque as pérolas não pulam nas nossas mãos, nós é que temos que buscá-las. A cinquenta anos era muito mais difícil mas hoje não há desculpas, pois tudo está a disposição, é só querer procurar.
Olá Ivan. É isso mesmo. Houve um tempo em que a grande mídia ainda se ocupava um pouco com a divulgação de música de uma maneira mais ampla, ou seja, abraçando diferentes estilos e tendências, inclusive a música de concerto. Acabou. Em compensação, a internet é uma verdadeira caverna do tesouro, onde podemos encontrar de tudo! UM abraço!
Obrigada Maestro!!
Quase sem tempo para acompanhar suas publicações, mas quando posso é um verdadeiro deleite!!
Muitaaaa sensibilidade embutida!
Carinho Mestre!!
Prezada Mara, obrigado por este comentário tão carinhoso! Apareça sempre, estou postanto novos artigos com frequência! Abraços Musicais!
Obrigado maestro! Gostei muito. Realmente eu conhecia apenas o Canon de Pachelbel; mas a Giga que o acompanha é também muito bonita. As demais peças são muito boas e agradáveis para se ouvir.
Continue com suas postagens bonitas e muito instrutivas. Sempre que tiver um tempinho procuro por elas com curiosidade e prazer.
Abraços
Obrigado, José Roberto. Realmente, há muitos compositores que são conhecidos por uma ou duas músicas, apenas, quando na verdade têm muitas obras admiráveis. Obrigado por seu comentário. Um abraço musical!
Maravilhosa postagem, levarei aos meus alunos do ensino fundamental para apreciarem a música barroca.
Obrigada, caríssimo Maestro João Maurício Galindo! ⚜️♥️
Oi Cleide, fico muito feliz por ter gostado, e mais ainda por saber que meu texto vai ser útil para seus alunos. Muito feliz, mesmo! Depois me conte o que eles acharam! Um abraço!
Brilhante enfoque do texto em denotar que uma obra com tanta qualidade não tenha alcançado, mesmo merecendo, o devido reconhecimento, mais uma vez obrigado parabéns caro maestro!!!
É interessante com o órgão esteve presente na vida de Bach, toda esta influência do Pachebel e depois Buxtehude, só achei curioso ele querer que o jovem Bach casasse com sua filha, ofereceu ainda um emprego de organista, mas foi recusado…rsrs A moça poderia não ser tão bela 🤭
Pois é Paulo, essa história é curiosa para nós, nos dias de hoje, mas em tempos antigos esse tipo de coisa acontecia. Obrigadp por seu comentário! Volte mais vezes. Um abraço
Maestro, gratidão pelo privilégio de receber seus comentários que são produzidos com afeto e carinho . Puro deleite !
Obrigado, Everaldo! Fico feliz por entrar em meu site e ler minhas postagens! Um abraço!
difícil não gostar de algo assim…
Olá querido maestro , encantada com esta tua pesquisa. Vc nos trouxe um “esquecido” para nós ouvimos.
Oi Elisa, obrigado por seu comentário! Os !”esquecidos” são muitos, ou em outras palavras: o mundo da grande músca do passado é imenso, muto maior do que imaginamos, e guarda mutos tesouros que estão disponíveis para o nosso enrquecimento espiritual. Esta é a função da música! Um grande abraço!
Excelente post! É difícil alguém mencionar algumacoisa sobre músicas de bom gosto!
Obrigado Mariléa!
Volte sempre!
Bom dia maestro, mais uma vez o :acaso” me presenteia com uma grata surpresa. Amo esse compositor desde que, há uns 15 anos atrás tive o prazer de participar de um pequeno coral de terceira idade em que a maestrina tinha também uma pequena orquestra e, num dos concertos dela, ouvi o Canon in D. Fiquei simplesmente maravilhada e sempre o ouço, cada vez com o mesmo deslumbre e a mesma admiração por esse artista. Muito obrigada por este post esclarecedor, principalmente pelos links com as demais peças da grandiosa obra obra desse imortal “esquecido”. Lembrando que em tempos modernos temos também muitos desses esquecidos que sequer são reconhecidos, devido ao avassalador dilúvio de mediocridade lançado pela mídia. Infelizmente! Grande abraço.
Sempre bom enriquecer nossa escuta musical com uma orientação tão cuidadosa quanto esta sua. Obrigada, mastro! Gosto muito do Canon em D e desconhecia as demais obras.