Compositores Britânicos

Começo a postagem de hoje relembrando meu tempo de estudante. Eu sempre tive um lado meio, digamos do contra. Enquanto todo mundo corria para um lado, eu gostava de, de vez em quando, correr para o lado onde ninguém estava indo. Isso quer dizer que eu acabava pesquisando algumas coisas que chamavam a atenção de muito pouca gente. Uma dessas minhas pesquisas envolveu os compositores britânicos.

Como estudante de música, eu praticamente só tocava obras de compositores alemães, franceses, italianos, russos e brasileiros. Até que em um belo dia comecei a pensar: e os compositores ingleses? Por que ninguém fala deles? Por que nunca ouço suas obras?

Quando perguntava isso a colegas ouvia como resposta que os compositores ingleses eram em geral desinteressantes… que com exceção de Henry Purcell e Elgar, não havia muito mais o que ouvir.

Eu nunca consegui acreditar nessas respostas, e assim, saí à luta. E descobri muitos compositores britânicos pra lá de interessantes. E um pouco da música desses compositores muito pouco conhecidos eu vou compartilhar com vocês hoje.

Malcolm Arnold

O primeiro deles é Malcolm Arnold, que nasceu em Northampton em 1921 e faleceu em 2006.  Arnold foi trompetista, ocupando uma das cadeiras da Orquestra Filarmônica de Londres. Em 1948, com 27 anos de idade, ele deixou a orquestra para dedicar-se exclusivamente à composição.

A maior parte de sua obra foi escrita para orquestra, destacando-se 9 sinfonias, compostas entre 1951 e 1982. Além disso escreveu muita música para cinema.

Seu estilo mostra influências de Sibelius e Berlioz. Esse comentário pode soar um pouco estranho para que conhece bem a obra desses dois compositores. Mas isso fica fácil de entender quando ouvimos um comentário muito frequente sobre sua obra, que diz: “existem dois Malcolm Arnolds: um leve e um pesado”

Claro que esse é um comentário simplista, mas que tem uma base na verdade. Acontece que Arnold era capaz de escrever música da maior densidade dramática, bem como expressar muito humor e sarcasmo.

Aliás, aqui e ali Arnold se permitia a liberdade de tocar os universos da música pop, do jazz e da música hollywoodiana, coisa que faz dele um compositor cada vez mais atual.

Vamos conferir esses aspectos de sua obra na interessantíssima Serenata para Pequena Orquestra, opus 26. Ela foi escrita em 1950, quando o autor tinha 29 anos. Tem 3 movimentos: Allegretto, Andante com moto e Allegro Vivace.

Malcolm Arnold : Serenade for small orchestra Op. 26 (1950).

Arnold Bax

Aliás, muitos desses compositores foram praticamente ignorados fora da Inglaterra durante suas vidas por serem considerados muito conservadores, distantes das experiências ousadas de artistas como John Cage ou Stockhausen. Mas esse julgamento talvez tenha sido severo demais, e sob esse aparente conservadorismo existe um pensamento musical muito rico e digno de ser ouvido.

Continuemos então com Arnold Bax, que viveu entre 1883 e 1953, ou seja, pertenceu a uma geração anterior à de Malcolm Arnold. Como este, Bax revela também a influência de Sibelius. A maior parte de sua música é muito densa, em harmonia e contraponto.

Sua obra é bastante grande, incluindo sete sinfonias, concertos, música de câmara, coral e música para cinema.

A obra de Bax para piano também é muito interessante. Bax era apaixonado pela Rússia e por sua cultura. Ele visitou o país em 1910, assim como aconteceu com diversos artistas em vários países europeus, encantou-se com os bailados russos que eram apresentados naquela década.

Iris Loveridge – Arnold Bax: Two Russian-Tone Pictures: National Dance (Gopak)

Edmund Rubbra

O próximo compositor que conheceremos é Edmund Rubbra, que viveu entre 1901 e 1986. Rubbra nasceu em Northhampton, mesma cidade natal de Malcolm Arnold. Trabalhou como professor, pianista e crítico musical, e só depois de muito tempo sua música passou a apresentar um estilo próprio, independente dos maiores compositores britânicos de seu tempo, como Bax ou Holst.

Um marco de sua evolução estilística foi sua 1ª Sinfonia, escrita em 1937, quando Rubbra já tinha 36 anos.

Sua obra inclui 11 sinfonias, concertos para piano, violino, viola, quatro quartetos de cordas, e uma boa quantidade de música sacra, como missas e motetos.

Rubbra talvez seja o menos conhecido dos compositores ingleses que aqui apresentamos. Contudo sua música é de grande qualidade e expressividade. Alguns críticos costumam dizer que ele é um típico compositor para ser gravado, pois sua música só revela seus segredos após ser ouvida várias vezes.

https://www.youtube.com/watch?v=Lctd33jY3bU
Edmund Rubbra: Lyric Movement op.24 (1929).

“Movimento Lírico” Rubbra não poderia ter escolhido um título mais apropriado. A música nos envolve num clima de sonho e facilmente nos tira do mundo real.

Sir Arthur Bliss

O último compositor que ouviremos é aquele que foi considerado o sucessor de Edward Elgar: Sir Arthur Bliss.

Imensamente festejado e homenageado em seu país, Bliss é praticamente desconhecido no Brasil. Sua música é extremamente brilhante e direta, causando forte impacto em quem a ouve pela primeira vez.

Dentre as obras de Bliss podem ser citadas como principais a ópera The Olympians, seus três bailados, Checkmate, Miracle in the Gorbals, Adam Zero, a trilha sonora do filme Things to Come, e sua Colour Sympony.

Porém dentre tudo isso o que mais me impressiona é o “Furiant” para viola e piano, em que os dois instrumentos parecem soar com a energia de uma orquestra sinfônica.

Vamos ouvir e tenho certeza de que vocês concordarão comigo.

Viola Sonata: III. Furiant: Molto allegro.

Hoje mostrei um pouquinho da enorme injustiça que se faz a muitos compositores britânicos espetaculares que são muito pouco ouvidos no Brasil, e aliás, também pouco ouvidos no continente europeu.

Será que essa é uma música que só cativa ouvidos britânicos? Gostaria de saber a opinião de vocês. Espero que tenham gostado deste post.

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11 comentários em “Compositores Britânicos”

  1. Obrigado. Até então, nunca tinha entendido o motivo de compositores ingleses não serem muito tocados. Sua explicação fez todo o sentido. Gosto muito de William Alwyn e de Frank Bridge.

  2. Obrigado maestro Galindo, por este e todas as ótimas e esclarecedoras postagens que o Sr faz sobre os mais diversos temas da música erudita.

  3. Maestro só tenho a agradecer essa sua disponibilidade e desprendimento de nos proporcionar conhecer e aprender essas pérolas da música clássica.

  4. Concordo com a crítica de que esses compositores pararam no tempo. Suas músicas nem parecem do século XX, quando houveram inúmeras tentativas de mudança no sistema tonal e outras experiências. Mas mesmo assim suas obras são belas e cheias de nuances, que valem a pena ser conhecidas. A boa música é eterna.

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